Crónicas de um Natal Colorido - parte 1
Natal, aquela época do ano tão
especial onde se celebra o nascimento de Jesus Cristo há mais de 1600 anos no
dia 25 de Dezembro. Inicia-se então lá para finais de Novembro ou para os mais
tradicionais na primeira semana de Dezembro os preparativos que começam nada
mais nada menos com a montagem da árvore de Natal, regra geral um pinheiro
natural ou artificial. Um outro símbolo de Natal não menos importante,
especialmente para a criançada é o Pai Natal (Papai Noel), inspirado na figura
de São Nicolau, um bispo do séc. III, e é responsável por trazer os presentes
das crianças num trenó cheio de renas, segundo a tradição. Bem como todos as
mamãs e papás neste mundo sabem, não se pode esperar que um velhote simpático
de barbas farfalhudas e brancas deixa as nossas chaminés e traga então o
desejado presente para cada criança em especial tendo ela Autismo. Nem acredito
que acabei de escrever isto, mas não deixa de ser verdade, certo? Passo a
explicar em seguida para os que foram apanhados de surpresa com a minha
afirmação.
Quando era mais nova, adorava
esta época pois era bastante mais virada para a reunião familiar do que é nos
dias de hoje, claro que também se recebia mais pijamas e meias do que agora,
mas parece-me a mim que era mais “mágico”. Bom, mas os anos passam e quando
finalmente formamos a nossa própria família corremos o risco de sermos nós os
responsáveis por organizar os preparativos para a grande noite da Ceia e claro
para o tradicional almoço de Natal a 25 de Dezembro, caso não passemos o Natal
em casa de familiares. Como tive um acidente rodoviário num regresso a casa da
festa de Natal em miúda, sempre tive não digo “fobia” mas sim receio de me
deslocar para longe de casa nas últimas duas semanas do ano, basta ver a taxa
de acidentes que ocorrem em média nessa época do ano para reforçar este meu
sentimento. Assim sendo, ainda antes da Verónica entrar nas nossas vidas já o
nosso Natal era passado no conforto do nosso lar e devo dizer que adoro.
A dinâmica do Natal cá em casa
começou a mudar a partir do segundo e terceiro Natal da Verónica, o primeiro
Natal era muito bebé nem dava para perceber o que se passava mas no segundo
começamos a franzir o sobrolho ao verificarmos que ficava praticamente imóvel e
sem pestanejar para a árvore de Natal, mais concretamente para as luzes
coloridas a “piscar”, claro que ao fim de alguns minutos o que poderia ser um
interesse era como se estivesse hipnotizada ou pior que nem “estivesse” sequer
ali. Apesar de se ter registado na memória esse momento, ele só seria recordado
no ano seguinte exactamente pelo mesmo motivo com a agravante que agora se
fazia o somatório de outras situações do género, claro que se estamos a ter
consultas de Genética e as perguntas começam a não fazer sentido ou até
demasiado sentido (Ex.: a sua filha aponta, diz quantas palavras etc etc) ficamos bastante alarmados. Depois havia
aquela parte da falta de interesse por brinquedos, em especial novos brinquedos,
é como soar todos os alarmes possíveis e imaginários na nossa cabeça. Não
tardaria a chegar então o dito diagnóstico e uma nova saga por fazer tudo ter
sentido e sobretudo conseguir captar a tal “magia”, podem não acreditar mas
precisamos todos dela, uns mais outros menos mas a vida sem ela é apenas isso
vida mas as plantas também têm vida certo? Pois bem, eu resolvi captar essa
Magia, se consegui? Não sei, digam vocês depois de lerem o que se segue, não
estará propriamente por uma ordem cronológica pois não sei qual seria ao certo
e porque vou escrevendo aqui conforme vou recordando algumas peripécias que me
ocorrem, então cá vai.
Primeiro tenho de vos explicar
como é a relação da Verónica com o Natal para perceberem algumas coisas, mães e
pais de miúdos dentro do espectro muito provavelmente vão identificar bastantes
semelhanças, faz parte. Brincar foi algo que teve de ser ensinado, é estranho
ter de ensinar uma criança de 3 ou 4 anos a brincar e ser necessário a ajuda
extra de uma terapeuta, contudo foi exactamente o que aconteceu por aqui. Durante
a terapia era lhe apresentado um boneco e acessórios para cuidar dele e por
imitação era induzida uma espécie de “brincadeira funcional”, apenas imitava
não fazia nada ao boneco por iniciativa própria quanto mais imaginar algo com o
boneco. Era frustrante de observar parecia algo bastante artificial mas não
havia outro caminho a seguir senão aquele, mais tarde haveríamos de colher
esses frutos. Esta história não é uma história triste nem nós somos uma família
triste, apenas tivemos um começo diferente da maioria, só isso.

Vamos lá então começar a fazer
a lista de prendas para a Verónica:
Uma lista possível para
meninas na faixa etária dos 4 – 8 anos:
1. Bonecas
2. Conjuntos
de loiças
3. Legos
4. Conjuntos
de pintura
5. Figuras
de animação infantil
6. Palácios
e casas de bonecas
7. Puzzles
8. Jogos
didáticos
9. Instrumentos
musicais ou afins
10. Livros
de histórias
Imaginemos agora que essa
lista era para a Verónica J
:
1. Bonecas
(apenas e só se for alguma princesa da Disney que seja a rebelde da história,
como a Ariel (pequena Sereia) ou a Merida (Brave), o resto é completamente
posto de parte);
2. Conjuntos
de loiças (para além de ter imensas herdadas da irmã apenas servem para irem
para a banheira, imagine-se só para beber água morna do banho);
3. Legos
(um brinquedo muito versátil e colorido que permite estimular a criatividade,
isto se estivermos dispostos a usar a imaginação, passava a vida a alinhar os
legos por cores e tamanhos e atualmente não lhes liga);
4. Conjuntos
de pintura (a maior parte que se encontra à venda nos supermercados não tem uma
qualidade boa mas tem imensas cores que eram descartadas porque a caneta preta
de ponta fina da mãe era a única selecionada para desenhar, portanto nada de
cor);
5. Figuras
de animação infantil (regra geral as crianças adoram animação e têm personagens
preferidos, não havia interesse por nada que fosse animação na televisão mas
lentamente simpatizou com o Mickey e veio então finalmente o interesse quase
obsessivo pelos My little poney, o que foi uma enorme festa cá em casa)
6. Palácios
e casas de bonecas (o único interesse era fazer demolições até não restar a
mínima hipótese de erguer fosse o que fosse mas isto era bom, tudo era melhor
que o desinteresse total);
7. Puzzles
(foi a salvação cá de casa durante uns tempos, fazia puzzles com mais peças do
que eram indicadas para a faixa etária dela mas a partir do momento em que
completava um puzzle era uma despedida “fúnebre” do puzzle, para quê voltar a
fazer o mesmo puzzle? Ao fim de algum tempo perdeu o interesse total);
8. Jogos
didáticos ( um mal necessário das terapias é usar-se jogos didáticos para se
trabalhar com os miúdos mas leva a rejeitar muitas vezes jogos desse tipo para
lazer, a Verónica não foi excepção);
9. Instrumentos
musicais ou afins (embora a tenha apanhado a cantar Bon Jovi (It’s my life) algumas
vezes ou a música dos My little poney nunca mostrou interesse nos instrumentos
musicais, a não ser claro para os desmontar para ver como são feitos);
10. Livros
de histórias (não gosta que se leia uma história para ela, lê partes que lhe
despertem a curiosidade mas não do princípio ao fim, livros com extras
(texturas diferentes, imagens em 3d, etc eram destruídos também para perceber
como eram feitos).
Finda
a lista e tendo em conta que existe uma variedade de tudo o que foi sugerido
para lista de prendas cá em casa, venham daí comigo às compras.
Quando
entro numa grande superfície comercial em plena época natalícia, encaro como se
estivesse num verdadeiro campo de batalha do tempo do Rei Arthur, talvez esteja
a ser demasiado dramática mas já lá chegaremos. Está fora de questão de trazer
crianças nesta altura, quem trata do marketing destas superfícies sabe explorar
e bem as “criancinhas”, tudo salta à vista de tal forma que dou comigo a ver
crianças “grandes” a brincar e a carregar em tudo o que é botões dos bonecos e
peluches que se encontram nas imensas prateleiras destinadas ao consumo. E
então penso: “Como é possível um brinquedo fazer tanto sucesso com um adulto e
não com a minha miúda? Ah….volta lá ao campo de batalha do rei Arthur.” Quando
olho para os peluches macios parece que a criança que há em mim diz para os
levar para a Verónica mas soa claramente a desculpa e depois seria frustrante o
resultado final. Na secção das loiças, cozinhas de brincar, passo quase a
correr e até questiono se será mesmo falta de interesse dela os se são
brinquedos “estúpidos” a incitar a função da mulher na sociedade…..bem a
maioria nem deve pensar nisso e já vi miúdos encantados com vassouras e
esfregonas.
A secção das bonecas, barbies ginastas, barbies bailarinas, barbies
veterinárias, barbies etc, a boneca é tão versátil e não consegue sequer ser
atractiva para a minha miúda, pego geralmente numa ou outra e acho que afinal a
Verónica é capaz de ser uma criança super sensata. O que estou eu a fazer?
Birra com os brinquedos? Ou estarei a ter também um comportamento autista? Se
pensar bem começo a ouvir aquela conversa ao fundo a reclamar que este Natal vai
ter x de prendas para aquele filho e que se pudesse comprava mais x e talvez o
faça porque dia não são dias…..sortuda consegue ter ideias para presentes e eu
nem consigo ter ideia para um. Enquanto ando perdida nos meus pensamentos,
alguém me dá um empurrão com medo que eu leve uma daquelas barbies, mas o que
se passa com as pessoas nesta época? Dezenas de barbies iguais àquela e é
justamente aquela que está mais perto da minha pessoa que é relevante, no
início tenho vontade de refilar depois descubro que apenas passou uns 5 ou 10
minutos desde que entrei no supermercado e já estou extremamente cansada e
claro com o carrinho completamente vazio!!!! E já agora porque trago um carro e
não um cesto? Bem, a esperança é a última a morrer e o Natal é daqui a meia
dúzia de dias penso e de repente prefiro ir fazer as compras para a Ceia de
Natal, rapidamente mudo de ideias quando penso nas


Este
Natal foi quando ela tinha 4 anos, acabou por ligar aos puzzles e à Ariel
apenas embora não brincasse com ela propriamente andava com ela, tal como os
carrinhos. A maior surpresa estaria no Natal seguinte, cheio de Ponéis e outras
coisas que escreverei durante este fim de semana, escusado será dizer que o meu
humor também ficou bastante mais apurado e, por agora embora seja um quebra
cabeças fazer compras de Natal para a Verónica tornou-se sobretudo uma aventura
mais tipo Indiana Jones do que o Rei Arthur.
(continua)
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