domingo, 18 de outubro de 2015

Método Pivotal Response Treatment (PRT) para Autismo



No passado dia 2 e 3 de Outubro estive presente num Workshop Nível 1 do Pivotal Response Treatment (PRT) no ISMAI por causa da Verónica. Uma das melhores “armas” enquanto pais de crianças com necessidades especiais é termos formação, não basta sabermos qual é o problema temos de saber como os “ajudar”. Existe cerca de 200 métodos para Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), o que por si só torna a escolha algo difícil e preocupante, uma vez que apenas uma fatia muito pequena desses 200 métodos está validada cientificamente. Naturalmente, que muitos serão os pais que não optem por algo validado pela ciência mas cá em casa (talvez por defeito de ser Bióloga) essa hipótese até à data não se coloca. 


Mas afinal o que é mesmo o PRT? 

O PRT é um dos tratamentos (métodos) comportamentais mais estudado e validado cientificamente para o Autismo. Deriva da análise comportamental aplicada (ABA), tendo como objectivos o desenvolvimento da comunicação e da linguagem, assim como os comportamentos sociais positivos e ajuda nos comportamentos disruptivos. A grande vantagem deste método é a motivação, autogestão, resposta a várias pistas e início de interacções sociais.  De modo a tornar a intervenção bastante eficiente e poderosa , são incorporados procedimentos motivacionais (Ex: Escolha da criança, variação nas tarefas, uso de reforços naturais directos, etc.) pois o objectivo do PRT é conduzir a criança com PEA a ter uma trajectória de desenvolvimento mais típico, através de objectivos de intervenção individualizada, tendo como base as necessidades da criança.  Como acontece com outros métodos o PRT tem mais resultados quanto mais cedo for implementado, no entanto é um método que pode ser utilizado em qualquer idade pois apresenta benefícios na mesma.
Já há alguns anos que inevitavelmente ando a pesquisar sobre métodos e tratamentos relacionados com o Autismo e digo relacionados porque nem tudo o que se escreve sobre Autismo e diz é necessariamente verdade. Além do mais, quer queiramos quer não existirá sempre todo “um mundo” que fará disto um negócio mas para nós pais trata-se dos nossos filhos e cabe a nós escolher qual o caminho a seguir e não é fácil. Eu optei por fazer este Workshop do PRT pois há já algum tempo que sabia deste método (bastante usado nos Estados Unidos) e como de costume nem tudo o que se passa “lá fora” chega até ao nosso país, assim mal soube deste workshop não perdi a oportunidade. O que mais me atraiu neste tipo de método para além da sua validação, foi estar mais virado para a parte comportamental usando a motivação. 



Motivação

Todos os que conhecem bem a Verónica sabem perfeitamente que embora ela tenha Autismo tem acima de tudo uma personalidade bastante forte (muito segura de si), personalidade essa que não passa despercebido a nenhum médico, terapeuta, professor, educadoras, etc. Assim sendo, é uma criança que apesar de ter um elevado potencial para a aprendizagem quer esta seja académica ou não, tem problemas ao nível do comportamento que comprometem por vezes esses momentos de aprendizagem. A motivação é portanto a “alavanca” para esses momentos de aprendizagem mas nem sempre se consegue motivá-la pois a tarefa a cumprir pode não ser apelativa o suficiente para querer sequer esforçar-se para a concretizar. O PRT de forma a motivar usa reforços positivos de forma a compensar a criança pela tentativa de realizar a tarefa imposta mas também para a motivar a querer realizar a tarefa. Fará isto sentido? Na minha opinião faz, se a criança com necessidades especiais se esforça muito para concretizar uma tarefa imposta (Ex: comunicar por palavras, escrever uma frase, atar os atacadores dos ténis, etc) tem de ser recompensada pois é uma forma de valorizar o seu esforço e de motivá-la a continuar a fazer a mesma tarefa em outras ocasiões. Não há necessidade para alarme, não é necessário recompensar sempre, apenas em alturas mais complicadas até o comportamento correcto ocorrer de forma natural, até porque se a recompensa for um m&m’s não vamos querer que a criança coma um pacote inteiro em um ou dois dias. Os reforços positivos podem variar muito (depende muito da criança),  podendo ser um m&m’s, 10 min no tablet, um intervalo no baloiço, fazer um desenho, um abraço, etc. Se a criança adora tablets há que jogar com isso mas se a criança adora m&m’s o caminho passará por aí, no entanto estes reforços têm um tempo de duração, a criança não estará motivada de igual forma como nos primeiros dias, digamos que já percebeu qual o objectivo e é preciso encontrar outros reforços positivos. Antes da formação já aplicava algumas técnicas do PRT, algumas com plena consciência outras apenas por instinto mas nem sempre as coisas correm como nós queremos e chega um ponto em que estamos tão cansados que nem sequer estamos motivados para corrigir aquele comportamento no momento crucial pois pura e simplesmente estamos de “rastos” e só queremos sair da situação. Isto aconteceu várias vezes comigo, por vezes ia ao supermercado com a Verónica e ela fazia uma birra tão grande que eu não conseguia controlar (daquelas em que todo o mundo que está a fazer compras gosta de opinar e dizer que isso é mimo a mais ou que com uma palmada nesse “rabo” a ver se não aprendias a lição), mais do que qualquer coisa só queria que a situação terminasse e caí na asneira de uma vez lhe dar um ovo kinder só para ela parar com aquilo, se resultou? Não, não resultou pois a birra não fora provocada por querer algo (muito provavelmente fora por começar a haver muitas pessoas dentro do supermercado) mas já devem adivinhar o que aconteceu nos dias que se seguiram, a Verónica mal entrava no supermercado ia direito ao “prémio” mesmo antes de fazer “birra”…foi aí que percebi mais a sério o tamanho do erro que cometera. O problema destas crianças é que depois de um comportamento adoptado torna-se uma tarefa árdua corrigir ou eliminar esse comportamento disruptivo. O objectivo do PRT é esse, corrigir comportamentos e por essa razão torna-se adequado para crianças como a Verónica, além de ter a grande vantagem que a família pode e deve adoptar esse método pois muitos desses comportamentos acontecem em casa e não só no período escolar. Uma das coisas que me chamou mais à atenção durante o workshop foi que não basta as crianças estarem motivadas, quem lhe apresenta a tarefa ou pretende corrigir o comportamento disruptivo tem de estar motivado também, faz sentido? Faz todo o sentido, estas crianças são autênticas esponjas e a absorvem literalmente tudo o que as rodeia, logo se estivermos aborrecidos ou desmotivados não vamos conseguir motivar nem uma criança “normal” quanto mais uma com autismo. Este método defende por isso que haja entusiasmo e motivação também por parte dos que interagem com a criança. Não é à toa que por vezes quando estamos todos muito cansados cá em casa as coisas não corram da mesma forma do que quando estamos por exemplo no período de férias. A motivação é o fio condutor para o sucesso para tudo na vida, logo para estes miúdos é não mais nem menos que a ferramenta principal no que toca a corrigir comportamentos.

Flexibilidade

 O PRT defende ainda a flexibilidade mas se estes miúdos conseguem ser do mais inflexível que há faz sentido haver flexibilidade? A resposta é sim, estas crianças tendem a ser inflexíveis especialmente no que toca a alterar a sua rotina ou quando lhe és apresentado algo novo por exemplo, têm problemas em lidar com o inesperado pois transmite-lhes insegurança, levando depois a terem comportamentos disruptivos. A flexibilidade pode jogar muito a favor numa tarefa imposta, por exemplo uma criança que não quer escrever o que lhe pedem no papel mas sim jogar no tablet, podemos pedir que escreva o nome do jogo no papel, de forma a obter o que quer. A criança ficará motivada para jogar no tablet e escreverá o nome do jogo no papel, ambas as partes tiveram de ceder mas ambas as partes obtiveram o que pretendiam. Este foi apenas um exemplo mas muitos mais podem surgir (depende da imaginação e motivação de cada um e, claro da motivação da criança). Por exemplo pode-se apresentar “falsas escolhas” à criança, escolhe-se duas tarefas pré-seleccionadas e dá-se a escolher à criança, a criança escolhe por exemplo a tarefa mais simples em vez da mais difícil, logo a compensação será também de menor “valor” para ela. Aqui pretende-se dar uma certa ilusão de “independência” para escolha de tarefas ao mesmo tempo que a criança começa a ter a percepção que tarefas mais complicadas de realizar merecem uma compensação maior, podendo conduzir à motivação da realização dessas mesmas tarefas. 

Linguagem e comunicação

Outro ponto bastante importante do PRT tem a ver com a linguagem, criar oportunidades de uso de linguagem, isto é, trabalhar a linguagem com crianças com autismo não tem de ser só naquela sessão de terapia da fala mas sim em qualquer ocasião. Se o seu filho tiver uma ou duas horas semanais por exemplo de terapia da fala e só aí trabalhe a linguagem, faça as contas e veja as horas que perdeu para criar oportunidades. Muito antes de conhecer o PRT já criava estas oportunidades, no início era um pouco frustrante pois ou era um monólogo ou então era a ecolalia (o que não é muito problemático pois significa que está tudo bem fisicamente para conseguirem falar), mas nunca desisti, até cantar de forma parva de modo a que a Verónica interviesse para eu me calar, se alguém tivesse gravado acho que morria de vergonha mas de facto ainda hoje essa técnica funciona, muito embora agora venha acompanhada de outras palavras, mas não era esse mesmo o objectivo? Todos os momentos são susceptíveis de se criar uma nova oportunidade para comunicar e para a linguagem.


Em situação de “birra” ou stress o PRT não deve ser usado, ou seja, se está perante um comportamento disruptivo sabe que não vai conseguir nada até a criança se acalmar logo não adianta insistir nesse momento, quando for mais oportuno retomará de novo. Quando falei deste método ao médico da minha filha, disse-me que era excelente mas que não é eficaz sempre, como acontece com outros métodos mas disse-me uma frase que compreendi perfeitamente e registei: “ Por vezes de modo a antecipar situações disruptivas a compensação terá de ser dada antes e não depois. Não podemos ganhar todas as batalhas com as crianças.” 


Neste post abordei o PRT de uma forma muito resumida e também ligeira, este método é dos mais validados cientificamente e por essa razão há vários estudos publicados que poderão ser facilmente acessíveis a todos o que pretendam saber mais sobre o PRT. Não há métodos infalíveis nem perfeitos, o que funciona com determinada criança e família poderá não funcionar com outra mas, existe algo de bom a retirar de alguns métodos (não todos), para mim o PRT trouxe-me algumas estratégias comportamentais que enquanto mãe não me é difícil de aplicar e tem tido bons resultados pelo menos em casa mas lá está isto é um processo longo e só poderei dizer efectivamente se o PRT mudou a situação da Verónica radicalmente daqui a algum tempo. Segue em baixo alguns links úteis sobre o PRT e um link de um vídeo de uma família inglesa em que o PRT é apresentado como solução para o membro mais novo da família com Autismo. Vale muito a pena assistir, para além de vermos a autora do método a trabalhar com a família temos a oportunidade de ver como pode o método ser facilmente implementado nas nossas rotinas. Uma imagem vale mais que mil palavras.

https://youtu.be/Uz_GgSYxlSg